Foto:  www.ariquezadeviajar.com/2018/05/roteiro-de-3-dias-por-ouro-preto-minas.html 
 
                  
                   
                  MARIANA  - Foto Matriz Tour 
 
 
                  OURO PRETO E MARIANA 
                    - CIDADES DE MINAS GERAIS 
                  20.1.1986 
                    
                  Andei  pelos caminhos ondulados, curvos e sensuais de Minas, com seus contornos  repousados, sua silhueta antiga e seus espaços de tranquilidade e cordialidade. 
                    Súbitas ladeiras roliças e ancestrais de Ouro Preto.  
                    Descansei nas escadarias das igrejas vetustas e risonhas — nunca bisonhas — de  Mariana. 
                  As  igrejas de Minas têm janelas — olhos abertos, e portas — bocas adornadas, com  semblantes humanos, eternamente sorridentes quando não caladas e discretas,  entreabertas. Há igrejas caladas, alegres, algumas quase tristes, algo  empretecidas e dignificadas, um tanto aristocráticas, pelo tempo calmo de Minas  Gerais. 
                    Chovia se brilhavam os contornos dos velhos muros e a redondez das pedras  desgastadas pelo deambular dos passantes. 
                    No restaurante, diante de uma galinha à cabidela, ou com molho pardo, via o  amontoado de carros na praça central de Mariana, com a invasão de turistas do  período de férias. 
   
                    São os novos tempos, das estradas asfaltadas, dos novos hotéis, de uma classe  media que chora a perda de seu poder aquisitivo mas que sai em viagem e busca  caminhos de percorrer e ambientes de relaxamento e prazer.  
                    Bem diferente foi a primeira visita que fiz a Ouro Preto, em 1962. Foi no dia  24 de fevereiro. Fiquei hospedado na “República Atlântida” (na rua da Direita,  Conde de Bobadela, 35) administrada por estudantes da Escola de Mineralogia.  
   
                    À noite, as ruas cheias de pedestres subindo e descendo, em filas informais,  para o namoriqueio de praxe. Um bloco do “3º. Semestre”, animava. Era o “Zé  Pereira”, com motivo colonial, com alegoria sobre a tendência dos portugueses da  Colônia que “cruzaram” com suas escravas.  
                    No domingo 25 de fevereiro daquele ano de 1962 estive na casa de Guignard, que  havia ido para Belo Horizonte gozar o seu aniversário. Saí de visita, em  seguida, à casa de Tomás Antônio Gonzaga e, à noite, a uma missa especial na  Igreja de Nossa Senhora do Carmo. Mas era o mesmo Carnaval, como o seu Zé  Pereira, com os foliões e os travestis, que alegravam a cidade de cheiro  caracteristicamente antigo, que é Ouro Preto. 
                    Impressionei-me de fato com a “fila do passeio”, com gente subindo e descendo,  ordenadamente. 
   
                    O diário em recolho estas impressões está encardido e gasto pelas andanças nas  carrocerias de caminhões pela estrada, com colagens e recordatórios, inclusive  pedaços de papel de parede, passagens de ônibus, raspagem de ouro das talhas da  matriz de Nossa Senhora do Pilar, de Ouro Preto, restos de especularita, talco  e malacacheta do museu de mineralogia. O rapaz que eu era estava fascinado  andando e subindo aquelas ladeiras estreitas, espreitando aquelas esquinas  sossegadas, sentando naqueles batentes carcomidos, para descansar... 
   
                    Devorei cada detalhe no deambular curioso, escrutando adornos, fixando  peitoris, catalogando as multifacéticas sacadas, comparando as tantas janelas e  esquadrias caprichosas.  Agora eu já era  o homem maduro vendo Ouro Preto dos tempos modernos, a Mariana dos dias atuais,  entulhada de lojas de souvenirs, com turistas apressados e congestionadas ruas  com carros de cores natalinas das marcas da moda, do novorriquismo e das  excursões corridas, em que falsos e despreparados “guias” apelam para detalhes  amorosos ou mórbidos da vida de Tomás Antônio Gonzaga (o Dirceu) e sua Marília,  e dos Inconfidentes, para entreterem os excursionistas exaustos e sonolentos. 
   
                    Já naquele ano de 1962 os divertidos alunos das “repúblicas” montavam  exposições com objetos absurdos para se divertirem às custas dos turistas,  cobrando-lhes entrada: papel higiênico que teria sido usado por Marília de  Dirceu, dente arrancado de um cliente pelo Joaquim da Silva Xavier, ferro de  engomar do barão, os “bobs” em rolo da cabeleira dessa ou daquela sonhorinha...  Humor ingênuo e despretensioso.   
                    
                  
                    
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                  Dona  Olímpia [foto:Facebook] 
                     
                    Que ainda andava pelas ruas de Ouro Preto, meio louca meio mendiga, com trajes  antiquados e andrajosos, com seu bastão de anciã e seu porte de nobre figura,  era a Dona Olimpia.  A garotada saía  atrás dela, provocando-a. Muitas estórias fantásticas percorriam sobre ela pela  casas e ruas de Ouro Preto: que era belíssima, que havia sido riquíssima, que  tinha joias valiosíssima escondidas, que teria herança milionária por receber,  que fora amante de um homem poderoso, que foi casada com político de grandes  posses, que teria deserdado por infidelidade. Até lindo cartão postal, editado  pela Mercator (que eu tenho em minha “cartofilia” na Chácara Irecê, em  Pirenópolis, Goiás) chegou a ser   publicado com a imagem dela, no início dos anos 70. Dona Olímpia fazia  parte da imagem humana de Ouro Preto, envolta em mistério e romantismo.  Certamente que já terá morrido pois, mesmo no início dos anos 60, já era um  anciã, apesar de esbelta e vaidosa. 
                    Voltei outras vezes a Ouro Preto mas não a Mariana (cuja primeira visita fiz em  1964).  
   
                    Debaixo de chuva voltei a percorrer os caminhos conhecidos, com outros olhos,  já não de fascínio e encantamentos dos meus 20 anos, mas agora experientes e  inquisidores. As velhas cidades é que continuam basicamente as mesmas e até  mais bonitas, mais bem cuidadas, com muitos prédios restaurados, com  restaurantes e bares, novos museus e hotéis, agora mais voltada para os  visitantes do que para seus moradores. 
                   
                     
                     
                   
                    
                
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